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surrealismo

O surrealismo nasceu em Paris como um movimento artístico e literário, objetivando revolucionar a experiência humana, rejeitando a visão racional da vida, valorizando o inconsciente e os sonhos.  O termo, que significa além da realidade, foi cunhado pelo poeta Guillaume Apollinaire, ao escrever o prólogo da sua peça teatral Les Mamelles de Tirésias, de 1917. André Breton utilizou-se da ideia central de Apollinaire, baseada no “estado de fantasia supernaturalista” para escrever o primeiro Manifesto Surrealista, de 1924, afastando-se da realidade e aproximando-se do funcionamento real do pensamento. Nos termos de Breton, trata-se de "resolver a contradição até agora vigente entre sonho e realidade pela criação de uma realidade absoluta, uma supra realidade". Interpretação dos Sonhos (1900), de Sigmund Freud, é geralmente associada como a obra teórica de influência inaugural do movimento, mostrando que a realidade é muito maior que a vida consciente, e destacando a importância do mundo onírico, do irracional e do inconsciente. Relaciona-se diretamente o uso livre das obras de Freud e da psicanálise pelos artistas de vanguarda, explorando nas artes o imaginário e os impulsos ocultos da mente, em um momento artístico que seguia tendências construtivas e ao chamado retorno à ordem. O caráter anti-racionalista do movimento surge como alternativa ao cubismo, alimentado pela retomada das matrizes românticas francesas e alemãs, do simbolismo, da pintura metafísica italiana, e principalmente do caráter irreverente e desmistificador do dadaísmo, movimento do qual boa parte dos artistas surrealistas provinde. 

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Igualmente ao movimento dada, o surrealismo também se apresentou como uma crítica cultural mais ampla, interseccionando as artes em modelos culturais passados e presentes, com diferentes canais de expressão, como revistas, manifestos, exposições em variadas modalidades artísticas, como escultura, literatura, pintura, fotografia, artes gráficas e até cinema. No entanto, o movimento também se igualou a misoginia do movimento anterior, mesmo se tratando de um movimento artístico inovador e aberto a participação das mulheres, elas eram presenças constantes nas obras, porém raras enquanto participantes ativas do movimento.  Em geral, apenas as mulheres dos artistas eram admitidas, e mesmo assim, somente se passassem pelo crivo de Breton, mesmo que não exista notícia de um movimento artístico anterior ao surrealismo que tenha aberto tanto espaço para a participação de mulheres em seu grupo. Ainda que tenha sido pioneiro em seu engajamento, quando se pensa em surrealismo, os nomes que surgem a mente são essencialmente de homens, salvo Frida Kahlo (1907-1954) ou Meret Oppenheim (1913-1985), que em algum ponta são citadas, o fato da história não ter herdado nenhum nome que se equipare aos “grandes gênios” masculinos, mostra que os surrealistas até deram um primeiro passo, mas não concluíram o caminho, pois não mudaram concretamente o status da mulher artista e por outro lado, as próprias mulheres acabaram se afastando do movimento.

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As mulheres que expunham com o grupo raramente participavam das discussões teóricas do movimento, pois esse trabalho era quase que exclusivamente restrito aos artistas masculinos. Até quando as discussões eram sobre o papel da mulher no mundo artístico, elas quase não possuíam lugar de fala, permanecendo como um objeto de análise e não como sujeitas de sua própria vida. De acordo com Beauvoir, “é particularmente entre os psicanalistas que o homem é definido como ser humano e a mulher como fêmea: todas as vezes que ela se conduz como ser humano, afirma-se que ela imita o macho.” (1970, p. 71) e o fato do movimento ser baseado na obra do criador da psicanálise, Freud, possa explicar tamanha misoginia vigente. Os surrealistas idealizavam a mulher em uma forma mística, como uma musa com poderes ocultos e segredos indecifráveis, sem presença concreta, sendo uma projeção com a existência limitada à superficialidade imaginativa de ideias sem corpos. O que não significa que as mulheres reais não possuíssem suas próprias ideias, amadurecendo suas obras e muitas vezes abandonando o grupo e seguindo suas carreiras individuais, algumas delas até negaram a presença de características surrealistas em suas obras.

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A lógica da produção surrealista foi ancorada na concepção do acaso e da escolha a aleatória, principio central da criação dadaísta, utilizando das colagens e das assemblages para expressar os devaneios do inconsciente. A justaposição de objetos desconexos que a primeira impressão teria associações imprevisíveis, particularizam as colagens e objetos surrealistas. Um bom exemplo disso é a xícara de chá, pires e colher cobertos de peles, da artista mencionada, Meret Oppenheim. A crítica cultural empreendida pelos surrealistas se rebelam contra as convenções, os códigos morais e as inibições da mente consciente. O desastre da Primeira Guerra Mundial também ajudou a culminar no desejo de ruptura com a tradição. Na busca por novas formas de expressão, baseou-se nas articulações da arte pela política, onde a ambição revolucionária e subversiva, amparada na psicanálise, era totalmente contra a repressão dos instintos e a contra a dominação burguesa, e a ideia de revolução social, oriunda do marxismo, chocou-se com a sociedade capitalista vigente. As relações controversas do grupo com a política aparecem na adesão de alguns ao trotskismo, como por exemplo Breton e nas posições reacionárias de outros, como Salvador Dalí.

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A disseminação do surrealismo pela Europa e pelo Estados Unidos foi rápida. Nos Estados Unidos, o movimento serviu como inspiração para o expressionismo abstrato e para a arte pop. No Brasil, a artista Tarsila do Amaral (1886-1973) em sua fase antropofágica, pintou quadros com tendências surrealistas como Sol Poente (1929), Antropofagia (1929) e a Composição (Figura Só) (1930) e a artista Maria Martins, ficou conhecida como uma das principais escultoras surrealistas. Muitos acreditam que o movimento terminou em 1966, com a morte de Breton, mas o movimento surrealista continuou sendo uma força essencial, influenciando artistas atuais, como a escultora estadunidense Kelly Akashi (1983), a irlandesa Siobhán Hapaska (1963) e a iraquiana Hayv Kahraman (1981).

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